domingo, 7 de agosto de 2016

Carta de um velho pai a seu filho


        Amado(a) filho(a):

No dia em que este velho pai não for mais o mesmo… tem paciência e tenta compreender-me.
Quando entornar a comida sobre a minha roupa ou me esquecer de apertar os sapatos… sê paciente comigo e lembra-te das horas que passei ensinando-te a fazer as mesmas coisas.
Se, quando conversares comigo, eu repetir as mesmas histórias, que já sabes de cor como terminam, não me interrompas e escuta-me até ao fim… quando eras pequenino(a), para que dormisses, também tive de te contar, milhares de vezes, as mesmas histórias, até que fechasses os olhinhos.
Quando estivermos juntos e, sem querer, eu fizer as minhas necessidades… não te envergonhes de mim, compreende que não tenho culpa de não conseguir controlar esta incontinência… pensa nas vezes em que tive de mudar a tua fralda e a roupa para que estivesses sempre limpinho(a) e cheiroso(a).
Não me recrimines se eu não quiser tomar banho… sê paciente comigo… lembra-te das vezes que te perseguia e dos mil e um pretextos que tive de inventar para te convencer a tomar banho.
Quando me tornar inútil e ignorante perante as novas tecnologias, que me são difíceis de entender, como o computador, por exemplo, suplico-te que me dês tempo para me habituar e aprender, não gozes comigo nem te rias sarcasticamente das minhas limitações, isso magoa-me… lembra-te que fui eu quem te ensinou tantas coisas como: comer, vestir e como enfrentar a vida tão bem como hoje o fazes. Isso é o resultado do meu esforço e da minha perseverança.
Se em algum momento das nossas poucas conversas eu me esquecer do que estava falar… tem paciência e ajuda-me a relembrar do tema da nossa conversa. Talvez a única coisa importante para mim, naquele momento, seja o facto de te ter perto de mim, ter a tua atenção, de estarmos juntos e não o que estávamos a dizer.
Se alguma vez eu não quiser comer, insiste comigo, com carinho, assim como eu fiz contigo. Compreende que, com o tempo, não tenho mais os dentes nem a mesma agilidade para mastigar e engolir.
E quando as minhas pernas falharem por já estarem tão cansadas e eu já não conseguir equilibrar-me… com ternura, dá-me a tua mão para me apoiar, como eu fiz quando começaste a caminhar com as tuas perninhas tão frágeis.
Se algum dia me ouvires dizer que não quero mais viver… não te aborreças comigo… Irás entender, um dia, que isso não tem a ver com o teu carinho ou com o quanto te amo. Compreende quanto é difícil ver a vida abandonar aos poucos o nosso corpo e como é duro admitir que já não se tem o mesmo vigor para correr ao teu lado, ou para pegar-te ao colo, como costumava fazer;
Sempre quis o melhor para ti e sempre me esforcei para que o teu mundo fosse mais belo, mais confortável e mais florido. E até quando eu partir, construirei para ti outra rota, noutro tempo, mas estarei sempre contigo, zelando por ti.
Não te sintas triste ou impotente por me veres assim. Não me olhes com essa carga de dó… dá-me apenas o teu amor e compreensão. Apoia-me como sempre fiz contigo desde que começaste a viver. Isso dar-me-á força e muita coragem.
Da mesma maneira que te acompanhei no início da tua jornada… peço-te que me acompanhes agora, para terminar a minha.
Trata-me com amor e sê paciente e eu devolver-te-hei sorrisos e gratidão, com o imenso amor que sempre tive por ti.
Atenciosamente, o teu velho pai (ou a tua velha mãe).